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quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Pintando papai


―Pai, quer que eu passe esse restinho no seu cabelo?
―Tá louca, menina, eu sou homem!
A filha deu uma gargalhada e continuou a pintar o cabelo da mãe. O pai apressou o passo em direção ao banheiro. Ele já andava desconfiado que sua juba já não era mais aquela. Com quase cinquenta, falhava no cocuruto e prateava nas laterais. Sua madeixa crescia desordenadamente. Parecia até um cientista maluco. Olhou-se no espelho. É, precisava fazer algo! Voltou para falar com a filha, que finalizava com a mãe.
―Escuta, meu anjo, você não tem aí uma corzinha mais discreta?
―Claro, pai! Tem um produto especialmente desenvolvido pra você. Ele devolve as cores naturais do seu cabelo aos poucos. Nada artificial. Se você quiser, vou pegar. Senta aqui, que eu já volto. Aproveito e aparo essa gadanheira toda.
O pai titubeou um pouco. A mãe levantou-se.
―Senta ali, meu amor, imagine-se mais novo uns vinte anos...
Ele se sentou e curvou a cabeça, apoiando-a no encaixe para a lavagem. Fechou os olhos, relaxou... A filha retornou.
― Isso mesmo, pai. Antes de qualquer coisa, vou lavar sua cabeça, tirar as impurezas, hidratar, cortar e só depois passar o produto.
Sentia-se um rei com aquele tratamento. Por isso as mulheres adoram ir à cabeleireira...
A filha pediu-lhe para que mudasse de cadeira para que pudesse cortar e pintar, quer dizer, aplicar o produto rejuvenescedor em sua melena. Tônico capilar. Depois de alguns minutos...
― Pronto, pai, fique com essa touca por vinte minutos. Depois lave bem a cabeça pra tirar o excesso.
Esperou passar o tempo e seguiu para tomar um banho. Lavou bem a cabeça como recomendado, saiu se enxugando, olhou para o espelho e não acreditou no que viu. Um som gutural ecoou pela casa e se eternizou pelo infinito. Todos correram para o banheiro. Bateram na porta. O corredor estava lotado. Até o vizinho sarrista acorrera assustado com o urro da fera. A mulher já esmurrava desesperadamente a porta quando a maçaneta girou. Todos recuaram. A porta se abriu. De roupão, foi saindo devagarinho. Caras e bocas se multiplicaram. O silêncio tomou conta de todos. Tudo ao redor parecia parado. A esposa tirou as mãos da boca e deu uma gargalhada. Todos caíram na risada. Ele andava impassível. Não expressava qualquer emoção. O netinho gritou:
― Tá parecendo o pica-pau...
― Cala a boca, menino!
Alguém gritou o canto do pica-pau: “hê hê hê hê...”
Ele nem olhou para trás, seguiu até o quarto e, antes de fechar a porta, ainda ouviu o vizinho gritar:
― Se você quiser, a gente monta um grupo de pagode. Eu sei tocar pandeiro. É só você cantar, Belo...
Todos saíram em êxtase. A filha foi atrás de uma explicação e voltou com a embalagem do produto errado que havia usado.
― Pai, desculpa, abre... Eu usei o produto errado. Por isso você ficou loiro. Abre que eu conserto. É só descolorir e...
A porta se abriu e o que ela viu deixou-a mais chocada ainda. O seu pai, quase cinquenta anos, parecia mesmo um cantor de pagode. Pulseiras douradas, colares pesadões, camisa de linho, bermudão de malandro e sapatênis de tirar o fôlego. Deu uma voltinha, exibindo um novo look.
― Consertar que nada! Eu vou é curtir...
Colocou os óculos de sol, passou pela esposa estupefata e foi para a rua. Parecia celebridade. Todo mundo o cumprimentava. O vizinho ficou no portão morrendo de inveja.


2 comentários:

  1. Legallllllllllllll!!!! Gostei muuuuuiiiiiitooooo!!! É engraçado e surpreendente!

    Emília

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  2. ADOREI FOI SENSACIONAL,ROLOU MUITOS RISOS AKI EM CASA FICOU MELHOR QUE O OCORRIDO BJKAS AMANDA E FAMILIA

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