Quem já passou por aqui

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Rio 40º

Verão carioca. Calçadão de Copacabana. Olhou para o relogiômetro e lembrou-se da música. É, o Rio é quarenta graus, cidade maravilha, mas um purgatório da beleza e do caos. O mar estava soberano, a areia escaldante, o céu límpido e as pessoas... Ah!, as pessoas... Não se sentia uma naquele momento de sua vida.
Fuçava mais uma lixeira quando foi abordado por um estranho.
─ Isso é um assalto!
Assalto?! Como poderia ser?!?! Não tinha nada para ser roubado...
Virou-se devagarzinho e não acreditou. Realmente estava sendo vítima de um assalto. Levantou os braços lentamente e olhou para o revólver.
─ É de verdade?
─ Quer pagar pra ver, mané?!
─ Não, que é isso, mas eu não tenho nada pra você levar...
─ E essa sacola cheia de bugigangas?
─ Mas é lixo!!!
─ E daí, mané, tu não vai vendê?
─ Vô, né...
─ Então chega de lero-lero e passa pra cá logo.
Olhou para o revólver novamente, olhou para o pivetinho, abaixou os braços, sentou-se na calçada. O bandido não sabia o que fazer.
─ Senta aqui também, cara ─ espanando a poeira do chão. ─ Qual é o seu nome mesmo?
O garoto empolou o peito:
─ Di menor, cara. ─E o seu?
─ Eu sou o Neco... Sabe que eu nunca pensei que fosse ser assaltado algum dia?
─ O, mano, não é nada pessoal não, mas o mercado tá competitivo.
─ Não, tudo bem. Na boa mesmo, eu tô até feliz. Imagina quando eu contar pro pessoal que fui assaltado. Cara, ninguém vai acreditar.
Levantou-se e fez um pedido:
─ Dá pra você dar uma coronhada bem aqui ─ apontando o seu cocuruto.
O meliante não pensou duas vezes. Levantou-se e, com o olhar sádico, preparou-se para prestar um favor ao seu novo amigo.
─ Vai doer um pouquinho...
─ Tudo bem, vai em frente.
─ Vira pra lixeira, então, e finge que tá procurando alguma coisa. Vai ficar mais realista.
Gostou da ideia e até imaginou-se ator de televisão.
O moleque empunhou a arma pelo cano, levantou a mão, flexionou o tronco para desferir o golpe, mas parou ao sentir algo encostar em sua nuca.
─ Solte a arma...
A voz soou branda, mas firme, conhecia aquele tom. Não titubeou ao escutar o estalido da arma sendo engatilhada.
─ Isso, muito bom. Mãos na cabeça.
Quando percebeu o que acontecia, Neco não se conteve e foi interceder pelo bandido.
─ Seu guarda, não é nada disso que o senhor tá pensando não. Ele só tá me fazendo um favor.
─ Tudo bem, mas ele não tem porte de arma. Vai comigo pra explicar pro delegado ─ e saiu, arrastando o meliante.
Neco não acreditou. Era mesmo um desgraçado. Nem podia dizer que tinha sido vítima de um assalto. O máximo que podia contar era de um quase assalto, mas quem iria acreditar na sua história... Jogou-se no calçadão e chorou.

Um comentário: