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domingo, 6 de fevereiro de 2011

O pequeno grande herói



A visão não resistiu a tanta lembrança. Olhou para o teto e sentiu tudo girar. Tentou falar com Renan, mas sua boca parecia pastosa. As palavras se misturavam à língua e calavam o som das mensagens. Recostou-se no sofá. Sua respiração estava pesada. Sentia uma dor aguda que saía do peito e se propagava para seu braço esquerdo. O estômago queimava como nunca, e o inevitável parecia estar próximo. O suor já corria por sua face. Sentia frio e parecia contorcer-se de dor. Ouvia ao longe a voz do menino que já não mais distinguia em meio aos objetos da casa. Tudo se transformara em uma única massa, em um único som surdo, opaco, ocre...
Renan, que voltara da cozinha com água com açúcar, encontrou o avô caído de cara no tapete. Assustado com o que viu, começou a gritar. Estava sozinho naquele apartamento. Já não podia contar mais com seu herói que tombara no combate contra o tempo. Virou o avô com muito sacrifício usando almofadas como escoras e jogou água no rosto dele. Quase não percebeu reação.
Sem pensar muito, deu um pulo e caiu sentado no peito daquele corpo inerte. Levantou-se rápido e repetiu a ação, como ensinara sua tia na escolinha. Nesse instante, percebeu que o avô voltava a lutar pela vida e esboçava reação.
― Calma, vô, você vai conseguir ― sussurrou ao seu ouvido, passando-lhe as mãozinhas no rosto.
O avô balbuciou algo inaudível, e o menino o repreendeu.
― Descansa, vô; descansa. Vou chamar a ambulância.
Saltou sobre o telefone como se agarrasse um bote salva-vidas em pleno oceano.
Em pouco tempo, a sala estava tomada por paramédicos que se debruçavam sobre aquele enfermo. Renan estava no colo de sua mãe que o beijava. O avô já recebia todos os cuidados para ser levado por uma UTI Móvel. Quando passou na maca por Renan, percebeu que tinha sido abençoado pelo toque daquele anjo. Piscou para o menino e se foi.


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